sábado

Saber o que se passa enquanto passa.

Foi estranho ter-me dado conta de que uma coisa me afectava tanto, sem que eu tivesse dado conta do quanto me afectava.

Uma das razões pelas quais as mães são as mais típicas co-dependentes, começa logo aqui, nesta confusão entre maternidade e sofrimento e de uma espécie de aceitação incondicional de que ser mãe doi.
Como ser mãe doi, e doi a todas as que o são, então é tudo normal e é aguentar.

Eu, que comunico de uma forma ou de outra com tantas pré-mamãs e com as mães de todas as crianças que foram sendo coleguinhas da minha filha ao longo da sua escolaridade, e com as mães que agora são avós, mães daqueles que eram só filhos quando eu também ainda era só filha, e ainda não mãe... habituei-me a considerar completamente normal e aceitável passar por todos os sofrimentos que me coubessem com a placidez das vacas no campo, porque isso simplesmente é normal.


Existe uma mística em torno da gravidez, do parto e dos primeiros meses do bebé, que nos envolve, e que tem uma base cultural e ancestral profunda que nos diz que quem se tenta poupar aos sofrimentos de mãe, é má mãe.
E esta ideia está de tal forma enraizada que as próprias mães se gabam do que sofrem, cada uma com uma história mais sinistra, como se tudo isso fosse aceitável e normal.

É razão de orgulho, porque passar sem sequer hesitar, por tudo isso, pelos filhos, é sinal de que se é uma boa Mãe. Mãe essa instituição simbólica de abnegação e altruísmo, de cuidado, pureza e amor que ainda paira nas nossas entranhas simbólicas sem que sequer nos demos conta disso.

Continuamos a chorar aos pés da cruz. Continua a ser suposto não poder fazer nada, não haver nada a fazer, e nem sequer ser o nosso papel na história encontrar soluções.


Eu amo ser mãe. Aliás... eu nem sei não ser mãe. É uma coisa que chega a confundir-se com o que sinto que sou na minha definição mais profunda de mim mesma.

E pergunto:
Será que não há outra forma?

Será que não podemos agarrar a parte maravilhosa de ser mãe e largar esse lastro de sofrimento suposto?
O meu caminho de pessoa tem sido viver nessa linha que separa a necessidade de sofrer pelos outros, da necessidade de acordar para certos absurdos e largar essa necessidade da mão.
Porque largar essa necessidade da mão, é eventualmente o melhor que posso fazer pelas minhas filhas. Dar-lhes espaço para que um dia não tenham de viver com esse estigma de filho que é a noção de que todos fizemos as nossas mães sofrer de uma forma ou de outra.
E é a forma de criar para as gerações vindouras da minha linha de filhas e netas, uma forma de estar no corpo de mulher, na maternidade e por isso na humanidade de ser gente; que não precisa de sofrer para provar que ama. Basta ir sempre encontrando formas de aceitar o que não se pode mudar, mas mudar com garra e alegria tudo o que faça a lágrima transformar-se num sorriso pacífico.

É que eu não tenho nada contra a placidez das vacas no campo, mas acho patológico ruminar em silêncio dores sofridas no limite do corpo, com o ar de êxtase místico de quem nem percebe que existem outras formas melhores de ser e de viver as coisas.

3 comentários:

  1. Bom dia
    Eu ainda tenho a minha filha no meu ventre, e já me sinto um pouco "renegada". É tudo elaa. eu posso estar a passar uma má gravidez, mas o importante é q com ela esteja tudo bem. Até já me trazem flores a dizer q são p ela, ou atender o telefone e ouvir: "Bom dia Mariana (a minha filha)". Caramba! e a Ana? Eu não tenho ciumes, q fique bem claro, só acho q lá porque vou ser mãe, tenha que perder a minha identidade. Enfim... já me alonguei. Por vezes qd refilo/reclamo, sinto qq as pssoas pensam q sou uma parva e ciumenta.....
    Kisses

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  2. :-)
    A mim sucedeu-me o mesmo quando tive a minha primeira filha. E isso fez-me sentir que demasiadas vezes era filha de fulano, mãe de sicrano, e o meu nome, a minha expressão pessoal e importância como indivíduo independentemente da minha família estava em causa.
    E estava.
    A questão não era bem ciúmes. Foi eu ter percebido que andava a fazer pouco por mim, pouco do que eu podia ser para me tornar mais "destacada" no filme da minha vida.
    E ainda hoje ando à bulha com isso...

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  3. Bom dia
    Eu creio q não vou nunca desistir. Mas tb sei q pelo caminho vou encontrar opiniões negativas, expressoes menos sorridentes, enfim... não me importo... eu sou mesmo assim.... mau feitio ;)
    Bjinhos

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